Pontos de sutura - Capítulo 04
Dohan olhou em volta sem tirar a máscara. Ele estava pensando muito sobre esbarrar com Hyewon desde ontem, mas quando se tornou realidade, ele se tornou covarde e opinou que definitivamente não queria enfrentar o amigo. Ele não queria nem mesmo olhar na cara dele. Por fim, decidiu que o evitaria até estar mentalmente preparado e estudaria todas as possibilidades disponíveis.
Dohan, que segurava uma sacola com suas roupas, apertou o botão do elevador com o rosto totalmente coberto como se fosse um protagonista de um filme de espionagem. Estava tão concentrado que, naturalmente, acabou dando um salto digno de admiração quando alguém se aproximou dele e o agarrou pelo ombro, embora, felizmente, não fosse Kang Hyewon.
— Enfermeiro Lim, que surpresa!
Era o Dr. Lee Jeong-eun, com quem ele trabalhava à noite. Dohan lutou para acalmar sua mente assustada, enquanto o colega se uniu a ele no pequeno elevador. A sala de cirurgia, a unidade de terapia intensiva e a sala de espera para as enfermeiras ficavam todas localizadas no terceiro andar. Então, quando ele apertou o botão “3” e encostou as costas na parede para esperar, Lee Jeong-eun voltou a falar, perguntando:
— E aí, como foi a folga? Descansou bastante?
— Foi péssimo. Fiquei doente.
— Eita, que azar…
Dohan respondeu, dando-lhe um sorriso amargo e apontando para o rosto, onde era possível apenas ver seus olhos salientes graças à máscara. Ele a usava porque achava que seria incapaz de lidar com suas expressões faciais adequadamente perto de Kang. Mas Dohan, que não queria explicar algo assim porque parecia tão ridículo, apenas deu a desculpa de que não estava em boa forma.
Já no terceiro andar, assim que saiu do elevador, dobrou a esquina e continuou andando até encontrar a entrada do “centro cirúrgico”. Assim que atravessou a entrada marcada com uma grande placa vermelha que dizia “Proibida a entrada de pessoas não autorizadas”, começou a cumprimentar os médicos, enfermeiras e todas aquelas pessoas que aparentemente tinham um caminho diferente para si. Como o vestiário não era dividido em “médicos” e “enfermeiros”, mas sim por gênero, os residentes — mais comumente chamados de “escravos cirúrgicos” — entravam e saíam com muita frequência sem prestar atenção.
Dohan, que abriu a porta para ver se Kang Hyewon estava lá, viu que Choi Ki-joon, um médico generalista, era o único a trocar de roupa em frente ao armário no fundo da sala, fazendo-o suspirar de alívio.
Dohan, que acenou rapidamente para o colega, abriu seu cubículo e colocou as cuecas que trouxera de casa, uma a uma. E então, aproveitando esse privilégio que lhe permitia usar dois armários por ser “enfermeiro-chefe”, abriu a segunda porta para colocar seus livros lindamente em ordem alfabética.
Ao contrário de outros médicos, que frequentemente grudam fotos de familiares ou amigos, o armário de Dohan parecia um armário em um shopping. Ele tinha muitos xampus, condicionadores e produtos para o corpo: ceras e cremes, esponjas e panos, tudo para tomar banho no hospital e sair confortavelmente.
Ele vestiu uma bata cirúrgica azul e depois foi conversar com Choi Ki-joon, que tinha o armário totalmente diferente.
— Ei… Se você vai se casar, por que não me convidou?
— Ah… De quem você ouviu?
— Do Kang Hyewon. Fiquei triste por ficar de fora.
— Hahaha… eu disse a ele enquanto estávamos operando.
Choi Ki-joon e Dohan, que sempre transportavam pacientes para cirurgia, eram incrivelmente amigáveis um com o outro. Na verdade, neste hospital, não havia ninguém que não fosse amigo de Dohan, o gênio. Todos gostavam dele, afinal, ele era gentil e cheio de energia.
Dohan sentou-se no chão do vestiário. Ele suspirou por um momento e começou a enfiar os pés nas grandes meias de compressão que trouxera de casa. Ele sempre disse que usar meias como essa era uma necessidade básica para as enfermeiras da sala de cirurgia, já que elas ficavam muito tempo de pé. Então, vendo Dohan, enfiando seus pés grandes em lindas meias cor de damasco, Choi Ki-joon mudou um pouco de assunto:
— Ontem, Kang Hyewon estava irado.
— … Por quê?
— Ele teve uma emergência durante a noite com um paciente com apendicite aguda… Ele estava horrível.
Com as palavras de Ki-joon, Dohan lembrou que era Na-young quem estava de plantão.
— Mas Na-young o ajudou, certo? É estranho que ele tenha tido problemas.
— Sim. Mas parecia que Kang estava mais agressivo do que o normal. Daí já sabe: isso deixou a garota nervosa.
Com as palavras de Choi Ki-joon, Dohan pareceu adivinhar um pouco a situação.
Kang Hyewon nunca dizia NADA durante as operações. Ele apenas se movia aqui e ali e olhava para os instrumentistas, como se pudessem ler sua cabeça. Nos dramas e filmes, os médicos que frequentemente eram vistos na TV gentilmente estendiam a mão e diziam aos outros enfermeiros quais eram os instrumentos cirúrgicos necessários para prosseguir o procedimento com sucesso, mas a realidade era diferente. Quase não havia cirurgiões que mencionavam o nome dos instrumentos que desejavam, então as enfermeiras tinham que ficar muito atentas e aprender o método cirúrgico e o procedimento com antecedência para entregar os itens necessários para o próximo pedido sem que o cirurgião falasse. Às vezes, mesmo na mesma cirurgia, os instrumentos usados pelos médicos podiam ser diferentes, então eles tinham que estudar as características específicas de cada cirurgião. Como resultado, muitas vezes as coisas davam errado quando os estudos dos enfermeiros encarregados eram insuficientes ou quando eles estavam em uma operação que eles não tinham experiência. Na-young era alguém que estava apenas no terceiro ano e cometeu um erro porque a operação realizada foi uma laparoscopia.
— Aff… Fala sério! Ele não poderia simplesmente dizer pelo menos um “me dê isso, por favor”? Por que ele sempre assim? Fica olhando de um jeito tão assustador sem motivo nessas horas pra quê?
Hyewon costumava olhar para a outra pessoa sem dizer uma única palavra. Se o assistente cometesse um erro, ele teria que resolver por conta própria… mas isso era pior do que uma bronca. Além disso, Kang Hyewon era conhecido no hospital por não ser nada legal, então ele não interagia adequadamente com outros médicos ou enfermeiras. Ele não era simpático nem mesmo com seus chefes. Na verdade, havia rumores de que ele teria sido expulso há muito tempo se não fosse tão excelente em seu trabalho como médico. Dohan, que estava preocupado por sua enfermeira, parou por um momento e perguntou:
— … Ela está bem? Quero dizer, ela recebeu alguma advertência?
Ki-joon respirou fundo e trocou todas as suas roupas, finalmente se levantando de seu assento. Dohan, que estava com as duas pernas em meias de compressão, também se levantou do chão para tentar ajeitar as calças.
— Bem, Na-young está completamente apavorada desde então. Acho até que ela chegou a chorar.
— Hmmm…
Dohan murmurou sem jeito já que não sabia o que dizer.
— De qualquer forma, deixe pra discutir com o Kang quando ele não estiver de plantão. Poupe-nos de todo esse drama.
— … Hahaha… não sei do que você está falando.
— Você mudou de turno depois de anos sendo fiel e pontual e ele estava encrencando com todo mundo. Eu não sou idiota, cara. Algo aconteceu entre vocês dois.
— Não aconteceu nada.
— E eu tenho certeza que foi sua culpa, mas você é muito covarde para se desculpar.
— Bem… e você é horrível. É por isso que sua esposa vai te enganar!
— Quê? O que isso tem a ver!?
Incapaz de assumir sua covardia, Dohan sorriu e deu um tapinha nas costas de Ki-joon antes de fechar seu armário de vez. Pela forma como contou, ficou claro que Kang Hyewon também estava muito chateado com a situação e, por sua vez, Dohan já começava a ficar irritado com a ideia de ter uma conversa com um homem que iria manter sua boca fechada o tempo todo. Maldito.
— Naaaah, é brincadeira. Parabéns pelo casamento, cara! Com certeza vocês formarão uma família muito linda e feliz.
— Aaaw… obrigado!
Dohan então se aproximou de Ki-joon e deu-lhe um grande abraço para parabenizá-lo por um casamento ao qual ele provavelmente não iria. Choi Ki-joon, com um sorriso no rosto, saiu primeiro do vestiário e então Dohan suspirou. De repente, o enfermeiro começou a bater a cabeça contra a porta de metal. Estava com medo de sair. Estava com medo de vê-lo. Tinha medo de falar com Hyewon. Sentia como se estivesse prestes a ser arrastado para o matadouro e destrinchado. Como resultado, mesmo após terminar os preparativos, ele não saiu do vestiário por muito, muito, muito tempo.
Ele checou suas anotações e as canetas que sempre carregava no bolso. Trocou os cartuchos de tinta por outros sobressalentes que comprou antecipadamente na internet e, depois passou bastante tempo lavando as mãos que ficaram manchadas durante o processo. Dohan, que estava obviamente escondido no vestiário usando isso como desculpa, apurou os ouvidos para o caso de alguém entrar pela porta enquanto ele estivesse de costas. Ao ouvir as vozes de seus colegas ecoando pela porta, fechou rapidamente o armário e se inclinou um centímetro em direção à porta, para checar quem estava a caminho.
— Doutor Kang, já comeu? Aceita uma xícara de café?
— Sim. Seria bom.
Era Kang Hyewon.
— Iiiiiiiiih, merda!
Nesse momento, Dohan saiu correndo pela entrada do vestiário como um potro com o traseiro em chamas. Antes que Kang Hyewon girasse a maçaneta, Dohan se lançou rumo à porta como um jogador de futebol americano e abaixou a cabeça para cumprimentar Kang Hyewon e o chefe dos residentes que estavam em frente à porta com seus rostos confusos com o que acabara de acontecer. Como a cirurgia que ele fez pela manhã foi bastante longa, Kang Hyewon só deixou a sala de cirurgia quase às 3 horas da tarde. Então Dohan, que acabara de encontrar alguém que não queria ver, franziu a testa sob a máscara e disse:
— Boa tarde. — e se moveu desajeitadamente na frente dos dois, como se todos fossem estranhos para ele.
— … Está tudo bem?
— Hahahaha, estou ótimo. Por que não estaria? Estou muito, muito, muito bem. Bem, estou saindo. Foi um prazer. Espere, por que um prazer? Nós somos… somos parceiros há muito tempo, certo?
— …
— … Bem, tchau.
Dohan acabou criando um espetáculo tão estranho que chegou ao ponto em que se sentiu sortudo por nunca cogitar em se tornar um ator. Inclusive, ao imaginar que talvez Kang Hyewon o seguiria, Dohan correu pelo corredor como se tivesse uma emergência. Os Crocs que ele usava estavam saindo do pé todo o tempo, mas não era hora de se preocupar com frivolidades.
Atrás de seu cabelo ruivo esvoaçante, o homem ouviu Kang Hyewon chamando seu nome várias vezes, mas o ignorou e correu para a sala de espera das enfermeiras, fingindo não saber de nada.
Dohan correu para a sala e fez contato visual com a Srta. Kim, que estava distribuindo convites de casamento.
— Doutor, Dohan, por favor, venha aqui.
— Ah, ah… sim, estou indo. Prazer em ver você.
— Aqui está o convite para o meu casamento. Não falte!
— Oh, sim. Eu ouvi a notícia do Dr. Choi. Parabéns!
Quando Kim lhe entregou o convite de casamento, em um envelope branco com um laço, Dohan aceitou imediatamente e sentou-se junto à escrivaninha mais afastada da porta. O relógio do computador agora marcava 3 da tarde. O turno normal do dia funcionava até as 3h30, mas ele saiu correndo como se estivesse atrasado para um compromisso.
— Estou bem, idiota.
— … Perdão?
Mas Dohan já estava batendo com a testa na parede novamente.
Ele não ia agir assim, só que quando ele viu Kang Hyewon, sua mente ficou em branco e ele se lembrou do rosto na cama gritando “Dohan!”. Ele nem conseguia se lembrar da cena corretamente, então não sabia por que apenas aquela maldita expressão parecia tão clara.
Sentado diante do computador, como um homem sem sonhos nem esperanças, os trabalhadores da tarde começaram seu turno, um por vez. Entre eles, estava Yoon Ji-hoo, uma nova enfermeira que estava sempre atrás dele em busca de conselhos. Ao vê-la se aproximar, endireitou o corpo, que estava quase deitado na cadeira, e a perguntou se ela “já estava pronta para a ação”. Era hora de parar de ser um tolo e se reorientar como um profissional. E como era um trabalho diretamente relacionado à vida do paciente, ele tinha que estar sempre alerta. Assim, pelo menos por um tempo, ele colocou o caso com Kang Hyewon em um canto distante e decidiu continuar sendo o melhor entre os profissionais.
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Continua…
Tradução Rize
Revisão MiMi