Pontos de sutura - Capítulo 05
Até o início deste ano, a alocação de salas era relativamente simples, mas justo agora todas as salas de cirurgia estavam abertas em sua capacidade total. Assim que a consulta da tarde terminou, Dohan verificou o cronograma apertado e organizou o novo plano de ação para suavizar as coisas. A nova enfermeira, Ji-hoo, estava lá para verificar a programação da cirurgia de hoje e até havia começado a preparar os itens necessários para a participação dos médicos especialistas.
Yoon Ji-hoo, apesar de ainda ser estudante, trabalhava freneticamente para colocar tudo em ordem, e Dohan, que era seu superior, era quem iria participar como o “enfermeiro circulante” da operação. Afinal, era comum que em uma cirurgia dessa categoria se contasse com um circulante experiente que compreendesse e movimentasse o fluxo geral do centro cirúrgico para que tudo corresse de maneira mais orgânica. Como eles estavam realmente saturados, geralmente após uma operação, eles precisavam se dirigir imediatamente para a próxima e, após essa, para a seguinte. Era tarefa de Dohan limpar a sala de cirurgia, trazer os instrumentos cirúrgicos esterilizados, posicionar as mesas com cortinas esterilizadas e informar que estava tudo preparado. Era tedioso e repetitivo, mas ele já estava acostumado o suficiente para não demorar muito. Por outro lado, Ji-hoo era desajeitada e muito, muito lenta.
Assim, embora sempre tivesse um horário bastante apertado e estivesse acostumado a se mover em um fluxo semelhante aos seus colegas de trabalho, Dohan sentia-se duplamente cansado ao fazer tudo isso com uma novata que prestava atenção em cada passo seu. Apenas uma hora de serviço havia passado, mas Dohan voltou para a sala de espera e se esticou no sofá, tentando descansar os olhos. Enquanto ele pensava em uma maneira simples de recuperar o fôlego, Kim Mihee, que também havia sido sua colega de classe na faculdade, aproximou-se dele e perguntou:
— Você já comprou os sapatos do uniforme?
Dohan mostrou a ela seus crocs, então ela riu dele.
— Quer saber? Compre Jibbitz para colocar em seus Crocs. É o que todos fazemos aqui.
Dohan, ao observar os sapatos de Mihee, que se destacava entre as enfermeiras do centro cirúrgico que usavam o mesmo uniforme, respondeu que não era seu estilo colocar adereços nos sapatos. Eles usavam uniforme 365 dias por ano, cardigã ocasionalmente e jaleco branco ao sair da sala de cirurgia para almoçar. Num hospital onde todos usavam a mesma roupa, as enfermeiras gostavam de enfeitar os pés, inserindo adereços em forma de florezinhas, corações, animais ou até mesmo o Mickey Mouse, chamados de “Jibbitz” nos buracos dos crocs. Na ocasião, Ji-hoo se agachou e viu que tinha um monte de Jibbitz amarelos brilhantes em seus sapatos. Quando a residente tentou tocá-los, dizendo serem muito fofos, Mihee deu um tapa em sua mão.
— Não. Você não pode tocar nos sapatos de uma enfermeira. Isso faz com que o turno se torne pesado.
— … Isso explica muita coisa.
Kim Mihee, apesar dos vinte e poucos anos, parecia ter comprado um monte de Jibbitz em uma loja de departamentos no fim de semana. Então, de repente, Dohan tirou um Jibbitz do fundo do bolso da calça e o estendeu para ela na palma da mão. Era um pequeno adereço em forma de emoticon, com um rosto sorridente amarelo e um laço na cabeça.
— Aqui, para os seus sapatos.
— … Por que você está dando para mim?
— É um suborno.
— Pra quê?
Quando ela perguntou, Dohan caminhou lentamente e sentou-se entre a enfermeira e a residente.
— Sobre Kang Hyewon… Disseram que ele e a enfermeira residente pediátrica se separaram hoje. Eu o ouvi na sala de cirurgia e, bem… em outras circunstâncias, eu perguntaria a ele em pessoa, mas estou muito ocupado hoje.
Com as palavras de Dohan, Mihee se lembrou de quando Kang Hyewon disse a ela que havia começado a sair sério uma colega de trabalho um mês antes de se separar dela definitivamente. Assim do nada. A razão para a separação, ela pensou, foi simplesmente porque ele ficou entediado. E eles só haviam saído juntos duas vezes! Uma quando eles decidiram fazer isso pela primeira vez e outra pouco antes de terminarem. Kang Hyewon era um homem que se doava totalmente para o hospital. Mas já era a quinta vez este ano que Kang Hyewon arranjava e terminava com uma namorada. Nesse aspecto, ela chegou a cogitar que Kang Hyewon provavelmente era mais bad-boy do que Dohan. E como ele nunca saia do hospital, seus alvos românticos sempre foram os mesmos: funcionárias, residentes e enfermeiras de plantão. Ainda assim, toda vez que o assento ao lado de Hyewon ficava vago, apareciam pessoas dispostas a domá-lo.
— Por que ele terminou com ela tão do nada? O que ele disse a você? Ele falou alguma coisa?
— Bem, eu não sei mais do que você. Em primeiro lugar, ele não é o tipo de bastardo que fica falando da vida íntima por aí.
— … Claro.
— Mas talvez, como ele é extremamente bonito e vem de uma família muito importante, ele queira encontrar a melhor mulher para ser a mãe de seus filhos.
Com a resposta de Mihee, Dohan instantaneamente sentiu como se estivesse falando sobre aquela “lei de conservação da raça”, que buscava preservar genes superiores. Assim como os ômegas agem com os alfas.
— Hmmm… Por outro lado, ele tem boas habilidades, é um bom professor, um bom cirurgião, além de ser o mais bem pago por aqui e até chegar a ser capa de revistas de saúde relevantes. Isso me diz que não, ele não precisa de uma parceira. Ele só sai com elas porque está entediado. Como posso dizer… elas não são importantes para ele, sabe?
— Talvez…
— … Mas por que você está parece tão interessado nisso de repente? Você está com ciúmes do Kang?
— Não! Eu só estava curioso.
Mihee abriu bem os olhos e encarou Dohan. Com isso, Dohan riu e estalou a língua. Afinal, ele definitivamente não queria parecer um alfa chato que tinha ciúmes de um beta comum. Por outro lado, Mihee apenas sorriu, como se estivesse tirando sarro dele.
— Eu também me relacionei com mulheres daqui.
— … Não conta se você apenas as leva para um hotel.
Em primeiro lugar, Dohan odiava namorar no local de trabalho. Segundo ele, ele não queria que sua vida profissional ficasse difícil depois do rompimento. Ele nunca teve um pensamento de ciúme ou raiva por seu amigo ter namoradas antes, mas agora parecia que Mihee estava batendo nas costas dele sem parar por conta de um tópico que não deveria ter sido usado contra ele para começar. Além disso, embora ele fosse diferente de Hyewon, ele também tinha um rosto bonito, um corpo bem esculpido e era muito, muito romântico.
— Acho que não tenho nada a dever pra ninguém. Nunca magoei ninguém. Sou um alfa perfeito, não acha?
— Ah, sim… você se lembra quando fez aquela ômega chorar na frente da UTI?
Dohan fechou a boca.
Ano passado, uma ômega com quem ele havia transado algumas vezes veio ao hospital para reclamar pessoalmente por ele ter terminado por mensagem de texto. Na verdade, ela protestou com firmeza, como se eles estivessem apaixonados por mais ou menos um século. Só de pensar naquele momento, o rosto de Dohan pareceu empalidecer instantaneamente.
— Essa pessoa não conta. Tínhamos um acordo e ela quebrou.
— Ok, e aquela vez que um homem veio até a estação de ambulância e deu um tapa na sua cara? Ou aquela vez que…
— Já chega. Beleza. Entendi o conceito. Sou um lixo. Muito obrigado.
Dohan concordou, desolado. Ele não tinha escolha senão dar a ela a satisfação de vencer esta rodada.
— De qualquer forma, estão dizendo que alguém já está de olho nele.
— Quem?
— Kim Jeong-ah, do departamento de anestesia.
Com as palavras de Mihee, Dohan se lembrou da anestesiologista que foi à sala de cirurgia tempos atrás. Ela era muito jovem, mas certamente havia muitas similitudes entre ela e Kang Hyewon. Coisas como seu tom de voz e comportamento. E quando o nome surgiu, Dohan se lembrou dos dois, caminhando lado a lado no corredor do hospital. Parecia que eles se davam muito bem e, ao contrário de outros doutores, ela não pareceu nada desconfortável na companhia de Hyewon.
‘Se houver uma pessoa adequada, eu me caso.’
Naquele dia, as palavras de Hyewon no salão de baile do hotel enquanto cuidava do seu nariz, de repente vieram à mente. Assim que ele se lembrou, franziu o rosto e estremeceu. Como se estivesse coberto de sujeira, a sensação tornou-se tão horrível que as palavras não poderiam descrever.
— Não. De jeito nenhum.
Dohan começou a parecer um menino de cinco anos que teve seu brinquedo favorito roubado. Os olhos de Kim Mihee se arregalaram lentamente em resposta à sua reação inesperada.
— O que foi?
— Não é nada. Ji-hoo, vamos trabalhar agora. Está ficando tarde.
Dohan pulou do sofá e estendeu a mão para Yoon Ji-hoo, que estava observando os dois há algum tempo. Ainda faltava um tempinho para a próxima cirurgia, mas ele não queria mais ficar ali ouvindo bobagens sem fundamento. Preferia verificar os equipamentos no almoxarifado central ou até mesmo limpar o chão.
— Ei! Dohan!
Quando Dohan saiu da sala de descanso, Kim Mihee o chamou de novo e de novo, desesperadamente. Mas quando ela percebeu que ele a estava ignorando, apenas suspirou e cruzou as pernas e os braços sem se dar conta. Não estava familiarizada com a mudança de atitude em Dohan, que sempre foi muito amigável e ativo nas fofocas do hospital.
— Dohan… e agora, que bicho te mordeu?
*
Ocasionalmente, havia médicos que blasfemaram quando a operação não corria bem. Não era dirigido a uma pessoa específica, e sim uma tentativa de afastar a frustração. Mas, como todos os humanos, quando as coisas não estavam indo bem, um “mas que merda!” parecia exageradamente pessoal.
Se a operação não corresse bem, todos os envolvidos ficavam completamente emocionados e a atmosfera começava a se deteriorar até se tornar exaustiva. Ele havia verificado a sala minuciosamente, mas no último momento, após o início da operação, uma das máquinas parou de funcionar e sua atenção foi chamada. Dohan, que percebeu tarde demais, saiu correndo da sala de cirurgia e trouxe outra das máquinas que já havia sido limpa e esterilizada com antecedência. Mas, assim que Dohan voltou, o médico gritou com raiva e o xingou, dizendo-lhe que “espero que você se prepare com antecedência para a próxima vez”. Nesse caso, a culpa foi de Dohan por não revisar o aparelho, mas as enfermeiras da sala de cirurgia frequentemente ignoravam os erros dos residentes. Era comum, mas hoje o xingamento do médico o atingiu mais que o esperado.
Yoon Ji-hoo reclamou que era injusto ser repreendida por algo técnico e quase chorou na frente de Dohan, que havia terminado de contar as gazes encharcadas de sangue, agulhas e todos os instrumentos usados na operação. Em seguida, sentou-se um pouco na frente do computador para escrever o laudo cirúrgico e parte de seu prontuário.
— Ele realmente tem que xingar assim?
— É porque estávamos errados. Você não precisa levar para o lado pessoal.
Dohan confortou Yoon Ji-hoo, enquanto dava tapinhas na cadeira que acabara de apoiar as pernas, que sofriam por ficar em pé por tanto tempo.
— Ainda assim, me sinto mal porque… porque ele estava agindo como um… idiota!
— Hahaha… Faremos melhor da próxima vez, mesmo que não tenha sido nossa culpa.
A coisa mais importante na sala de cirurgia é o trabalho em equipe. A partir do momento em que eles entravam na sala e as luzes se acendiam, era preciso trabalhar em equipe para que o paciente sobrevivesse. Essa era a maior prioridade ali naquela sala. Era por isso que eles estavam aqui em primeiro lugar.
Dohan, com isso em mente, levantou-se de sua cadeira, tentando dar o exemplo para os residentes, e falou sobre a importância de limpar a sala de cirurgia após o término do trabalho. No entanto, Ji-hoo suspirou pesadamente, como se não pudesse se recuperar totalmente dos palavrões e de todas as repreensões desnecessárias.
E era Dohan, não Yoon Ji-hoo, quem mais queria respirar agora.
Graças ao fim de semana de folga e ao que aconteceu com seu melhor amigo, ele tirou três dias seguidos de folga que resultaram em uma carga ainda maior em seu corpo. Afinal, ser enfermeiro era um trabalho muito difícil: tanto fisicamente quanto mentalmente. Em particular, os enfermeiros eram frequentemente chamados para tarefas como limpar e arrumar, dificultando as coisas para Dohan, que precisava de um momento para se recompor. Além disso, a maldita Mihee o havia irritado!
Como se isso não bastasse, o cirurgião que viria a seguir era Kang Hyewon.
Sua respiração mudou a um ponto onde ele estava suspirando o tempo todo.
— Você está bem, Dohan? Por que está suspirando tão alto?
— Eu? Eu não estou fazendo isso. Eu só… É porque estou cansado.
A próxima cirurgia seria para uma hérnia inguinal indireta em um paciente do sexo masculino de 40 anos. Algo relativamente simples que levava em torno de 1 hora e 30 minutos. Mas o fato de ter que enfrentá-la em parceria com Hyewon dificultava a situação, mesmo se fosse um procedimento de 10 minutos. A sorte foi, talvez, que o trabalho de hoje não era em círculo, mas com uma barreira estéril, então ele não teria que ficar ao lado de Hyewon durante todo o tempo.
Dohan limpou bem a mesa, preparou o campo cirúrgico com Ji-hoo e começou a contar os instrumentos em voz alta. E quando os preparativos chegaram ao fim, Choi Ki-joon e um anestesiologista transferiram o paciente diretamente para a mesa. Aparentemente, a anestesiologista de hoje era a própria Dra. Kim Jung-ah, de quem ele ouviu falar graças a Mihee. E enquanto ela se preparava para a operação, Dohan a examinou cuidadosamente de cima a baixo. Ele não havia refletido muito sobre isso até agora, mas uma vez que ele prestou atenção, poderia dizer honestamente que a atmosfera que ela exalava era muito parecida com a de Kang Hyewon. Ela era uma dessas pessoas que ficava presa na sala de cirurgia e nunca via a luz do dia. Talvez fosse comum seu rosto ficar mais pálido por conta disso, mas, mesmo considerando essa variável, era possível perceber que ela tinha uma pele excepcionalmente clara e era muito bonita. Kang Hyewon era exatamente o mesmo. Ao contrário dele, que ficava moreno depois de jogar basquete sob o sol escaldante em um dia de verão, a carne daquele homem ficava completamente vermelha e, depois de muito tempo, voltava à sua pele pálida original. Além disso, já o havia tocado detalhadamente e percebeu que sua pele era macia como a de um bebê.
Depois que o tempo de espera acabou e o paciente foi desinfetado, Kang Hyewon também entrou na sala de cirurgia. Yoon Ji-hoo abriu seu avental e o ajudou a colocá-lo, pois eles não podiam tocar em nada após lavar as mãos para a cirurgia. No entanto, dali em diante, a responsabilidade era toda de Dohan. A frente do avental foi esterilizada e a parte de trás foi definida como contaminada. Por isso, era seu trabalho como enfermeiro circulante amarrar os laços do avental de Hyewon e prendê-los nas costas para que se ajustasse perfeitamente. Mas, enquanto tentava manter o contato mínimo, Kang Hyewon suspirou e virou a cabeça levemente para olhar diretamente para Dohan, que ainda estava atrás dele.
— Dohan, eu preciso falar com você depois da cirurgia, entendeu?
O que ele tanto temia finalmente chegou. Dohan fingiu não se importar muito e acenou com a cabeça, mas pensou por um momento que definitivamente iria desmaiar. Ao ouvir as palavras de Hyewon, que soaram como uma declaração de guerra, Dohan até começou a notar um suor frio que começara a escorrer por suas costas. Ele não podia mais evitar, afinal, eles supostamente ainda eram os melhores amigos do mundo! Foi, então, que Dohan decidiu fingir que tudo aquilo que aconteceu não era grande coisa e dizer apenas: vire a página e esqueça.
— Vamos começar.
Ao contrário do coração pesado de Dohan, a cirurgia transcorreu como esperado e não houve nenhum problema. No local dedicado ao anestesiologista, Kim Jung-ah, uma bela médica de rosto pálido, estava sentada, olhando apenas para o monitor para verificar os sinais vitais do paciente. Era como olhar para Kang Hyewon, mas em uma versão feminina, com uma expressão vazia que mostrava como ela estava focada em seu serviço. Além disso, ela era mais tranquila que as outras funcionarias, então era difícil imaginá-la tão atrevida a ponto de virar os cachorros contra Kang Hyewon.
Dohan olhou para Hyewon, que também estava muito atento no monitor do endoscópio e, depois, voltou a olhar para Kim Jung-ah, que observava a anestesia. Os dois tinham uma atmosfera tão parecida que pensou que eram como irmãos e chegou a se perguntar se o amigo realmente havia pensado em se casar com uma mulher como ela. E formar uma família com ela. Era um ambiente calmo e tranquilo e, de alguma forma, ele não gostou da sensação. E enquanto Dohan ficou parado e pensando em várias coisas, a operação logo chegou ao fim.
Kang Hyewon, que deixou os residentes para cuidar dos arranjos finais, afastou-se da mesa e olhou para o relógio. Ele, então, olhou para Dohan como se quisesse dizer algo e, por sua vez, Dohan o encarou a ponto de começar a se sentir desconfortável. Depois, olhou em volta com um sorriso nervoso sob a máscara.
— Vejo você no refeitório, Sr. Dohan.
— Oh… sim.
Por fim, Kang Hyewon deixou um comentário que parecia um tanto significativo:
— Suturas.
O residente que fazia os pontos ergueu a cabeça e olhou para os dois. Enquanto Dohan respondia com um suspiro, Hyewon passou por ele sem dizer mais nada.
°
°
Continua…
Tradução Rize
Revisão MiMi