Pontos de sutura - Capítulo 09
Uma semana passou rapidamente. E para surpresa de todos, descobriu-se que Hyewon não foi para casa nem uma vez durante todo esse tempo. No sábado, ele havia concordado em ir com Dohan até sua cidade natal para o aniversário de seu pai, então teve que correr para consertar seus assuntos pendentes antes dessa data.
E então, na manhã de sábado, dia em que eles viajariam diretamente para Seul, Dohan foi ao hospital buscar Hyewon antes das 9 horas.
O carro de Kang Hyewon, que permaneceu exilado em um estacionamento subterrâneo por quase um mês, estava coberto de poeira branca e um monte de outras manchas desconhecidas. Era meio estúpido que ele tivesse um, ainda que ficasse no hospital a semana toda, mas supôs que era assim que ele gostava de viver qualquer maneira.
Ao ver um grupo de ambulâncias paradas na entrada do pronto-socorro, Dohan pensou consigo mesmo: ‘Será que está cheio?’ E ele se perguntou se poderia ser vinculado a esse paciente e se teria que tirar mais uma hora de folga. No entanto, logo viu Hyewon que parecia ter acabado de tomar banho, o homem saiu do hospital, secando o cabelo molhado com uma pequena toalha várias vezes para evitar que pingasse. Então Hyewon, que estava balançando a cabeça, entrou no carro sem dizer uma palavra e colocou a mala na parte de trás. Hyewon e Dohan viajavam assim o tempo todo, então isso se tornou um hábito.
Dohan franziu a testa. Fazia muito tempo que ele não dirigia seu carro direto para o hospital, mas tinha que dizer que a sensação era a mesma de quando eram residentes. Dohan limpou a garganta, tentando encontrar algo para dizer.
— Você tirou um cochilo?
— Nem um pouco.
— Então faça isso, enquanto eu dirijo.
Quando o SUV preto saiu do estacionamento, Hyewon mudou de posição e sentou-se um pouco mais confortavelmente. Ele cruzou os braços, virou-se para a janela e encostou a cabeça totalmente no vidro. Ao contrário de seu tom áspero de sempre, quando Dohan lhe disse para dormir, o homem o obedeceu como um garotinho ordeiro. Foi porque Dohan conhecia muito bem o estado atual de Kang Hyewon, sem nem mesmo ter que ouvir uma explicação dele. Ele estava trabalhando de terça até sábado de manhã. Sabia que o homem dificilmente teria dormido e que com certeza só comia pão. Além disso, Hyewon, que se reuniu com Dohan em frente ao centro cirúrgico na última sexta-feira, parecia completamente lamentável.
Dohan abaixou o volume do rádio e se inclinou para poder empurrar um pouco o assento para trás.
No sábado de manhã, a estrada estava sempre congestionada, pois as pessoas saíam para passar o fim de semana. Então, talvez vinte minutos depois, o tráfego começou a se mover rápido o suficiente para que ele chegasse ao cruzamento onde ficava um parque de diversões fechado há muito tempo. Lentamente, começou a acelerar até atingir uma velocidade adequada para a estrada e, em seguida, ligou os limpadores de para-brisa para limpar algumas gotas de chuva que começaram a cair em todas as janelas. Como se quisesse evitar se molhar, o carro entrou no túnel bem a tempo, e o som de “puck, puck, puck” contra a carroceria do carro desapareceu.
No túnel mal iluminado, as luzes que se acenderam uma a uma iluminaram o rosto adormecido de Hyewon e depois desapareceram repetidamente até que ele foi envolvido pelas sombras.
Dohan olhou para o rosto do homem por um momento.
Não tinha a pele tão brilhante como quando era jovem, mas ainda assim eu era muito, muito bonito. Ele tinha cílios longos em pálpebras finas que tremiam de vez em quando. Um nariz suave e lábios perfeitamente desenhados. Era como a Bela Adormecida.
— Umm…
Nos últimos três dias, Hyewon não disse uma palavra sobre o que aconteceu no hotel. Além disso, não houve mudança em sua expressão e nada nele era diferente do normal. Então é claro que ele decidiu acreditar no homem quando disse que não conseguia se lembrar de nada daquele dia. Afinal, Dohan também não conseguia se lembrar de nada, exceto de Kang chamando seu nome várias vezes: ‘Dohan!’ Quanto ao que aconteceu com ele com aquela coisa do feromônio ômega, bem, ainda não tinha uma resposta adequada. No hospital ele sempre usava máscara, então não sentia nenhum cheiro em particular e nada incomodava o suficiente para ir ao departamento de exames. No entanto, ele pensou que, se o mesmo sintoma ocorresse mais algumas vezes, ele marcaria uma consulta.
Saindo do túnel escuro, fortes gotas de chuva atingiram o teto do carro pela segunda vez. O céu, que a princípio parecia claro devido a uma chuva repentina, agora estava cheio de nuvens escuras, como se a noite estivesse chegando. Dohan, que estava com medo de acordar Hyewon com o som, que era mais alto do que o esperado, estreitou os olhos e checou rapidamente. No entanto, Dohan de repente teve um pensamento estranho ao olhar para a bela figura do homem que ainda dormia com os braços cruzados e a cabeça apoiada no ombro. Originalmente, ele era um cara movido pelo desejo sexual e, se gostasse da aparência de alguém, seria o primeiro a se aproximar para levá-la para a cama. Mas Hyewon não era assim. Não importava o quanto ele estivesse bêbado naquele dia, ele não conseguia entender por que o homem se deixou levar pelo ritmo dele e fez sexo com ele.
— Que merda esse imbecil estava pensando?
Pelos padrões de Dohan, Kang Hyewon era como uma pessoa recatada. O mesmo que um monge ou um padre. Não conseguia imaginá-lo sendo selvagem.
Dohan, que ainda estava olhando para o rosto adormecido de Hyewon, com pensamentos um pouco complicados em sua cabeça, olhou para frente antes que tudo isso voltasse a devorar seus miolos, assim como aconteceu quando ele estava em casa. Ele tentou esquecer, mas em vez disso, Dohan franziu a testa novamente e olhou para Hyewon pela terceira vez:
‘Ah, Dohan…’
Outra imagem dele surgiu em sua cabeça. Sua pele estava vermelha, mesmo ao redor dos olhos, na ponta do nariz e sob a boca. Ele parecia tão animado em chamá-lo que até mesmo o rosto de Dohan ficou vermelho e ele começou a ficar muito nervoso.
— Droga droga droga…
— Você está bem? Você perdeu uma parada ou algo assim?
Então, Hyewon finalmente olhou para Dohan. Acordou com o som das gotas de chuva no carro, mas decidiu manter os olhos fechados para aproveitar a tranquilidade e a paz que lhe vinham depois de um tempo de duro trabalho. No entanto, o zumbido de Dohan ou o pequeno barulho que ele fazia com os dentes deixava seus nervos à flor da pele. Então Hyewon, que havia pensado em continuar fingindo dormir para não ser incomodado desnecessariamente, acabou piscando. E a primeira coisa que ele encontrou foi um olhar atrevido fixado em seu rosto.
— Idiota fica gritando assim, eu quase dei um soco em você.
Ele sorriu com as palavras de Hyewon.
Na verdade, ele estava um pouco preocupado com o itinerário de hoje para aquela casa, mas descobriu que o rosto de Dohan estava muito mais relaxado do que ele esperava. Para seu azar, Hyewon teve que dar mais notícias ruins a Dohan, que até agora estava sorrindo com seus dentes brancos, brilhantes e bem tratados: —Não poderei ir para casa por mais uma semana”.
— Por quê?
— Estou substituindo alguém.
Como era de se esperar, assim que Hyewon terminou de falar, Dohan franziu a testa e endureceu o rosto ao dizer que “eles eram filhos da puta” e que “se continuassem assim, com certeza iriam matá-lo”. Hyewon também apelou para o fato de ser força maior, mas nem isso foi suficiente.
— Você pensou sobre isso?
— Sobre o que?
— A casa.
— Ah, aquela coisa de morar junto?
Depois de sair do pedágio e ver os prédios de apartamentos organizados à direita e à esquerda, Hyewon trouxe um problema que eles haviam esquecido por um tempo. Certamente era uma oferta muito razoável, sem motivo para recusá-la, mas Dohan hesitou.
—… Não sei.
— Porque você não sabe?
Com a pergunta de Hyewon, Dohan virou a esquina, olhou para ele e sorriu.
— Porque eu tenho medo que você comece a querer me controlar se morarmos juntos.
— Do que você está falando?*
— Você sabe, coisas como ‘não saia com aquele cara’, ‘vá dormir’ ou algo assim.
— Eu já fiz isso com você?
Hyewon revisou suas ações passadas. A última vez que esteve com ele no saguão do hotel, disse a ele que precisava mudar seu comportamento, mas, na verdade, nunca havia discutido seriamente sobre a vida sexual promíscua de Dohan. Além do mais, ele preferiu ficar de boca fechada com medo de que seu amor não correspondido fosse exposto. As sobrancelhas escuras de Dohan se contraíram com a estranha expressão de Hyewon.
— Mesmo que você não diga, está tudo escrito em seu rosto. Você é como minha mãe.
Isso estava errado. Pelo contrário, era o oposto disso. Hyewon sempre esperou que Im Dohan conhecesse alguém mais velho e de mente mais fechada do que ele, e queria que o tratasse com severidade e o fizesse chorar. Esperava que desta forma ele percebesse que o único que esperava por ele em silêncio, o entendia, deixava tudo passar e estava ao seu lado frequentemente, não importa o que acontecesse, era Hyewon. É claro que teria sido bom se ele nunca tivesse conhecido ninguém, mas era impossível para Dohan fazer isso. E como esse era um pensamento terrivelmente egoísta, ele sempre mantinha a boca fechada para evitar essa conversa. Só que, no outro dia, no quarto de hotel, Hyewon cuspiu suas verdadeiras intenções e disse: ‘Então você será punido’.
— Você nem ira para a casa de qualquer maneira. É apenas um lugar para dormir.
— Bom… vou dar uma olhada para ver mais ou menos o preço que você vai me cobrar.
— Está pensando em pagar o aluguel?
— Acho que seria a coisa mais sensata a fazer.
— Bem, então vamos ver isso com o tempo.
— Ummm… isso não seria estranho? Eu acho que seria melhor morar sozinho, sabe?
— … Que porra você tem, está desconfortável comigo, Dohan?
— Não agora. Mas em algum momento será. Confie em mim.
Dohan disse isso sem olhar para Hyewon porque estava com medo de encontrar aqueles olhinhos de cachorrinho que o homem sempre olhava para ele. Se perguntasse a alguém do hospital sobre isso, eles obviamente diriam que a expressão de Hyewon estava em branco o tempo todo. Mas Dohan sabia melhor do que ninguém. Quando lhe diziam algo de que não gostava, seus olhos negros começavam a parecer preocupados, tristes ou mais opacos do que o normal. E ele sabia que, ao contrário de si mesmo, que parecia simples e sem sentido, Kang Hyewon sempre se preocupou demais com tudo, até com as menores coisas.
Hyewon também sabia que não era que Dohan se sentisse realmente desconfortável morando com ele, mas que ele pensava que seu estilo de vida logo seria um incômodo para o homem, que ocasionalmente voltava para casa para descansar.
Ainda assim, como sempre, eles apenas ignoraram e se concentraram em outra coisa.
— Ok, chegamos.
Enquanto conversavam, o carro chegou à sede da Universidade Deokwon. Fazia um ano desde que ele esteve aqui e nunca foi inteiramente de propósito. Era como uma espécie de punição ver seu pai e ouvi-lo falar sem parar sobre como seu futuro era horrível.
Os dois deixaram o carro no estacionamento e seguiram pelo corredor da sede, mais familiar que a filial, para finalmente parar em frente ao elevador que era para os funcionários.
— Olha só, se não é o Im. Oh? O Dr. Kang também veio nos visitar?
Um homem, vestido com um jaleco branco, que aparentemente reconheceu Dohan à distância, se aproximou e o cumprimentou antes mesmo que ele o alcançasse. Ele era um sujeito de aparência amigável, com uma identificação de funcionário de “radiologia” que eles já tinham visto várias vezes andando pelo hospital. Houve até um momento em que começou a se tornar muito familiar para Kang Hyewon.
— Kim, olhe nada além de surpresa… Urgh!
Dohan, que também estava prestes a cumprimentá-lo, de repente cobriu a boca com as duas mãos ao sentir a náusea novamente. O Dr. Kim Myung-Shin, do departamento de Radiologia, era o parceiro sexual de Im Dohan quando ele trabalhava na sede. Um Omega precioso e muito bem educado. Mas agora…
— Desculpe, não sei porque… Urgh.
Dohan cobriu a boca novamente na tentativa de conter a vontade de vomitar. Em resposta à reação repentina de Dohan, não apenas Kim, mas também Kang Hyewon, que estava ao lado dele, lançou-lhe um olhar um tanto confuso. Dohan acenou com a mão para indicar que estava bem, mas quanto mais perto chegava de Kim, mais enojado se sentia por dentro. Era o feromônio ômega. Estava… Muito, muito enjoado mesmo.
— Ah… não posso…
— Ei…
— …Você veio aqui para ver um obstetra?
Kim Myung-shin obviamente estava brincando com Dohan, mas Hyewon olhou para ele como se quisesse matá-lo.
— …Me desculpe, você está bem?
— Obviamente não é um bom momento. Sinto muito, mas você pode ir?
— Ah, eu já tenho que ir mesmo… Bem, vejo você outra hora.
No entanto, mesmo depois que ele saiu, o cheiro ainda estava na ponta do nariz, então Dohan se abanou com as mãos. Era uma quantidade muito pequena de feromônio que normalmente não detectaria bem, mas o estava deixando muito enjoado. Não fazia ideia de que a diferença entre usar máscara e não usar seria tão grande.
Enquanto Dohan batia no peito com o punho para tentar engolir o vômito, Hyewon olhou para ele com uma expressão preocupada.
— Ei, você está bem?
— Ahhh… não sei… Faz tempo que não entro em um carro, então acho que é por isso que ainda estou tonto.
— Mas você estava dirigindo.
No ponto de Hyewon, Dohan manteve a boca fechada. No caso do motorista, o movimento do veículo pode ser previsto para que haja menos sensação de disparidade nos sentidos. Dohan, que não tinha nada a dizer, olhou para Hyewon antes de encolher os ombros.
— Está tudo bem. Às vezes pode acontecer. Vou dirigir de volta, ok?
Hyewon virou a cabeça para os olhos de Dohan, que estavam cheios de coisas que queria dizer, mas que eram pacientes.
— Obrigado…