Pontos de sutura - Capítulo 34
—Olha só isso…
—O que?
—Parece sopa.
Kang Hyewon varreu o próprio cabelo caído, que ainda estava terrivelmente molhado do banho.
—Bem, obrigado.
Hyewon e Park Eun-soo estavam sentados um ao lado do outro no jardim do segundo andar do hospital universitário. A mulher suspirou por um minuto e então pegou a pequena marmita de Hyewon para ver o que havia dentro. E logo franziu a testa:
—Por que você tem dois sanduíches? Embora um pareça o irmão mutante deste.
Dentro de sua vasilha, havia um sanduíche bonito e outro com as bordas tortas, queijo amassado, figuras estranhas em cima e bacon envolto de uma maneira bastante estranha. Além disso, o pão meio queimado fazia com que parecesse muito pior do que provavelmente seria.
Na verdade, ele procurou uma receita na internet que dizia “Como fazer sanduíches bonitos para seu parceiro” e tentou fazer parecer um coelhinho usando um molde que comprou no supermercado. Mas como era a primeira vez que ele fazia, não foi surpresa que tenha saído horrível. Hyewon, que havia pensado por um tempo se deveria jogá-lo fora ou comê-lo, acabou comprando outro pão e decidiu levar esse para o trabalho para que Eun-soo visse e lhe dissesse exatamente onde ele errou.
—Em primeiro lugar, pare de estragar comida que já é perfeita.
—Anotado.
Hyewon levantou a cabeça quando Eun-soo fez o mesmo.
A primeira vez que Hyewon viu Eun-soo foi na sala de emergência do hospital central. Foi exatamente quando ele parecia terrivelmente desesperado para se tornar um Ômega que pudesse estar ao lado de Dohan e decidiu tomar um monte de supressores. Naquele dia, Hyewon, que desmaiou devido ao uso indevido e abuso de uma droga em resposta a um boato que ouviu de que poderia se tornar um Ômega se o fizesse, teve que ser levado à sala de emergência às pressas para tentar levar sua vida. O rosto pálido de sua mãe, que o encontrou no quarto, ainda estava tão claro em sua mente como se estivesse acontecendo agora mesmo. E quando ele recuperou a consciência, depois de completar a lavagem estomacal, uma avalanche de sentimentos de frustração e decepção o inundou tanto que Hyewon começou a gritar e chorar como se o mundo estivesse acabando naquele momento. Ao mesmo tempo, descobriu-se que Park Eun-soo estava hospitalizada na cama ao lado da dele. Ela se deitou, com os olhos bem abertos, e ouviu tudo sobre o que o garoto, que também iria para o primeiro ano do ensino médio, havia feito para ser internado. Ela puxou a cortina e perguntou a Hyewon:
—Por que você fez isso?
Normalmente ele a teria ignorado, mas agora ele precisava de algum conforto e também precisava estar com alguém que não fosse seus pais. Teria sido perfeito se esse conforto tivesse vindo de Dohan, mas é claro que era impossível.
—Eu quero ser um Ômega.
—E funcionou para você?
Eun-soo fez outra pergunta, mas Hyewon fechou os olhos e virou as costas em vez de responder. Como ela podia ver claramente, o resultado final foi um completo fracasso, mas a garota, talvez também com 14 anos, era curiosa e completamente persistente em querer saber a história. Além disso, Eun-soo falava constantemente com Hyewon sem se importar em ser ignorada. “Por que você quer se tornar um Ômega?” “Como você se sentiu ao tomar tantos remédios?” “Você está louco?” E assim por diante. Park Eun-soo era o tipo de pessoa que não conseguia conter suas perguntas, então Hyewon, que queria ficar sozinho, não teve a menor chance de pensar.
Logo eles foram transferidos para a sala geral, então, quando ele pensou que finalmente estava livre, Park Eun-soo foi hospitalizada na sala oposta e ele teve que ver o rosto dela o tempo todo. Ao contrário de Hyewon, Eun-soo estava realmente doente. Sua mãe havia morrido no mês anterior, então ela também havia tomado remédios. Só que para realmente se matar, não como o que Hyewon havia feito. E mesmo depois de serem liberados, acabaram se encontrando novamente na ala de “psiquiatria” onde tiveram que ser internados para completar o tratamento.
—Por que você quer ser um Ômega?
—Porque a pessoa que eu gosto é um Alfa…
—E daí? No amor, se você é um Alfa ou um Ômega, não importa.
Hyewon riu amargamente com sua resposta.
Ele precisava permanecer na instituição, ir ao psiquiatra e tomar seus medicamentos para poder sair dali e se tornar um médico, como havia prometido a Dohan que faria. E como precisava ser declarado curado para apresentar os papéis médicos para a universidade, ele se concentrou em sua terapia, participou de grupos de apoio e manteve um registro bastante meticuloso. E toda vez, ele acabava conversando com Eun-soo na sala de espera.
Um acontecimento infeliz tornou-se seu vínculo especial. Ela se tornou a única pessoa que conhecia os sentimentos íntimos de Hyewon e ele se tornou sua melhor companhia em um mundo que a fazia se sentir terrivelmente sozinha. Eles eram os únicos que sabiam das dores no coração um do outro que não conseguiam contar a mais ninguém.
—O ponto é que o sanduíche parece nojento.
—Mas não tem gosto ruim.
—Hahaha você quer que eu prove, maldito? Por isso você o trouxe na sua lancheira, né? Como pode ser tão descarado.
Mas quando percebeu que Hyewon estava olhando em sua direção com o rosto completamente inexpressivo, não aguentou mais e deu uma grande mordida para agradá-lo. A aparência era terrível, mas na verdade o sabor era aceitável.
—Agora outra pergunta. Você fez isso para poder dar a Im Dohan? Seja honesto.
—…
Hyewon não respondeu à pergunta de Eun-soo. Ela era uma pessoa muito questionadora por natureza, então mesmo que ele respondesse, sua curiosidade seria completamente interminável e ela pensaria em mais coisas para dizer para provocá-lo.
—Quando falei com você no lobby, todos me olharam de maneira estranha e me perguntaram qual era nossa relação. Então ouvi dizer que você só fica na sala de cirurgia com Dohan e também é super raro te ver com mulheres.
—Sim.
—Você ainda está na mesma situação? —Quando Hyewon assentiu, ela deu outra grande mordida no sanduíche e balançou a cabeça, dizendo: — Você definitivamente não tem jeito.
—E você? Está se adaptando bem à vida no hospital?
Hyewon mudou de assunto porque não queria mais falar sobre Dohan. Ao lado de Eun-soo, ele mais uma vez se sentiu como uma criança que entrou em depressão e depois tomou muitos medicamentos. Como se as coisas que ele queria esconder estivessem sendo expostas novamente. Eun-soo sorriu:
—Digamos que sim. Os médicos chefes estão nos mantendo em uma ditadura infernal. Meus colegas têm uma expressão como a sua, então dá vontade de chutá-los nas partes íntimas para ver se pelo menos reclamam ou algo assim.
—… Obrigado por sempre me ter em mente.
—Sem ofensas, sem ofensas.
Eun-soo deu um tapinha no ombro de Hyewon e riu, mas ele não seguiu o jogo. Eun-soo estalou a língua porque era uma expressão que nunca havia visto ele fazer quando estavam conversando assim.
—Hey, agora falando sério. Você está me deixando nervosa. Só diga como se sente.
E devido ao clima tão pesado, o assunto voltou diretamente para o amor não correspondido de Hyewon.
—Se você está apaixonado unilateralmente há tanto tempo, então parece que não tem mais nada a perder.
—…
—Eu não aguentaria.
—Bem, é fácil para você dizer…— Ele engoliu as palavras rudes que ia dizer em seguida e finalmente respondeu: —Se eu perder Dohan, não poderei durar um único dia aqui.
—Os enfermeiros deste lugar são incrivelmente bonitos. Sempre que uma oportunidade se vai outras aparecem.
—Vou… Vou só fingir que não ouvi isso.
—Se torne hétero então!
—Vire hetero você!
—Então vá atrás de algum outro enfermeiro que te dê atenção, idiota!
Diante das palavras de Eun-soo, Hye-won lembrou-se do rosto de Dohan quando se encontraram de manhã. Ele se perguntava se algo havia acontecido de errado durante as horas de trabalho ou se o médico havia repreendido-o novamente por causa de seu aluno. No entanto, a essa altura, provavelmente ele já estaria em casa, teria comido o sanduíche que deixou sobre a mesa e se deitado para descansar antes do novo turno. O inchaço em suas pernas já deveria ter diminuído um pouco até aquele momento, então o homem se perguntou como ele estaria agora e como se sentiria também. Hyewon estava preocupado com ele, mesmo que Dohan tivesse descontado sua frustração nele.
—Bem, é que… eu não sei. O que eu queria te contar é que ultimamente estou mais otimista com isso, sabe?
Era como se Dohan estivesse prestando mais atenção nele.
Hyewon esperava que Dohan se sentisse melhor depois de acordar e que ele voltasse para o lado dele para lhe mostrar aquele lindo sorriso que parecia desenhar apenas para ele ultimamente. A mulher ficou surpresa ao ouvir isso.
—Como assim?
—Há progressos significativos.
—Mas ele ainda te trata como amigo.
—É o que somos. Só estava dizendo que parece diferente do que estamos acostumados.
“Amigo” era uma espada de dois gumes que cortava o coração de Hyewon sempre que era mencionada. Mas graças a isso, ele podia estar ao lado de Dohan tanto quanto quisesse, tocá-lo, falar com ele e até mesmo dormir na mesma casa. Mas por outro lado, também significava que não podia cruzar a linha que definitivamente estava bem marcada no chão. Quando Hyewon inclinou a cabeça e mostrou um sorriso amargo, Eun-soo não perguntou mais nada e simplesmente o abraçou com muita força. Para alguém que sempre teve muitas perguntas para fazer, agora sua boca não tinha vontade de se mover.
Então, quando os olhos de Eun-soo encontraram os de Hye-won, ela sorriu lindamente para ele e então decidiu brincar com ele mordendo sua cabeça enquanto fazia um som de “nhom, nhom, nhom”. Mas ao contrário dela, que já estava relaxada porque havia terminado a rodada, Hyewon não teve a menor sensação de calma para começar a fazer coisas estúpidas também. Ele tinha que ir para a próxima cirurgia e, além disso, havia muitos pacientes externos que ele precisava revisar para dar alta.
Quando Hyewon se levantou do banco, sem dizer uma palavra, Eun-soo ficou chateada:
—Por que está me deixando?
—Tenho uma laparotomia.
—Okay. Tchau, querido.
Eun-soo acenou suavemente em sua direção. Se Dohan tinha Mi-hee como melhor amiga, uma mulher com uma personalidade ousada e forte, então Hyewon podia dizer honestamente que ao seu lado estava Eun-soo.
—Tchau.
Hyewon levantou a palma da mão em direção a Eun-soo em uma postura rígida, como se fosse um robô quebrado. A verdade era que ele não estava acostumado a fazer esse tipo de saudação para mais ninguém além de Dohan.
***
Foi uma semana angustiante. Dohan esteve irritado o tempo todo, 24 horas por dia, ou pelo menos sempre que ele lembrava o que aconteceu. Ele tinha uma atitude que não era de todo como a de um adulto maduro, mas, mesmo sabendo disso, não conseguia controlar suas emoções facilmente. Na verdade, ele não tinha intenção alguma de controlar. Dohan era originalmente egoísta, imaturo e ciumento e é por isso que ele colocou um “Não fale comigo” em seu rosto e não o retirou de lá por nada no mundo. No entanto, por mais que estivesse irritado, havia pacientes e trabalho a ser feito, e ele não tinha tempo para fazer uma pausa e pensar na situação. O estresse havia se multiplicado, e por isso ele não estava de bom humor, para prestar atenção se a gastrite, que havia acalmado por um momento, voltava ou não, ou qual era a razão de sua dor de estômago. Mais do que tudo, porque ele estava incomodado pelo fato de não haver como resolver as dúvidas e delírios que se acumularam fortemente dentro dele.
Ele olhou ao redor.
O fato de a sala de cirurgia estar ocupada significava que os cirurgiões também estavam.
Hyewon, assim como Dohan, tinham uma agenda matadora e por conta disso, os dois não conseguiram se encontrar cara a cara em público por uma semana e nem mesmo conseguiram se cumprimentar adequadamente na entrada. O tempo voou desesperadamente, houve apenas mal-entendidos entre os dois, e embora morassem na mesma casa, Hyewon não conseguia voltar e Dohan só chegava para dormir devido às horas extras contínuas. Dohan estava tão perturbado que lembrava o rosto de Hyewon milhares de vezes ao dia e ainda assim, diante da vida e da morte, esse problema se tornou completamente menor, algo que ele decidiu enfrentar em outro momento. No entanto, ele estava com os nervos à flor da pele. O estresse do trabalho e a pressão de pensar em Hyewon estavam cobrando um preço maior do que ele esperava. E como nunca antes havia sentido esse tipo de solidão, ele não sabia ao certo como evitá-la ou o que fazer para corrigi-la.
Aparentemente, o amor era muito mais difícil do que ele pensava. O rosto do homem vinha à mente dezenas de vezes por dia e, embora num momento ele se sentisse bem, logo depois seu humor desmoronava tão rapidamente que sua cabeça ficava vazia. Mesmo na sala de cirurgia, ele não conseguia parar de pensar em Hyewon por um momento e percebeu que isso piorou depois de vê-lo sorrir e conversar com Eun-soo.
Dohan pensou que talvez estivesse muito doente. Mas mesmo que não fosse algo assim, ele intuiu que definitivamente não era uma situação que pudesse ser tratada de forma leviana. E será que os ômegas, aos quais estava evitando, já haviam experimentado algo assim em algum momento de suas vidas? Era uma sensação muito semelhante a ter o sangue drenado ou ser esfaqueado
—Professor, você está doente novamente? —Kim Hee-jae perguntou isso depois de ver a horrível cor na pele de Dohan. No entanto, ele simplesmente parecia ter decidido balançar a cabeça em vez de responder. Dohan não queria dizer que estava tudo bem. Ele não queria responder às mesmas bobagens que sempre dizia aos seus colegas quando eles o cumprimentavam, e não tinha tempo para parecer legal ou relaxado como sempre. O Dohan bondoso que fazia as pessoas rirem quando estava na ala médica tinha desaparecido há muito tempo. Desde o dia em que aquela mulher chegou, para ser mais específico. Mas é claro, porque sempre foi amigável e atencioso, as mudanças de Dohan foram tão notáveis que todos puderam sentir claramente, eles ficaram preocupados com ele, mas também não queriam se envolver tanto porque achavam que deveria ser sério se ele já estava nessa condição.
—Não é nada, só preciso fazer um pouco de exercício.
—Como?
Hee-jae se assustou com as palavras de Dohan e o olhou com uma expressão de espanto que parecia completamente exagerada. E diante da reação tão intensa de Hee-jae, Dohan se estremeceu sem perceber e olhou para trás, se perguntando se havia algum médico importante atrás deles que estivesse intimidando-os. Mas claro, não havia ninguém.
—O quê foi? Por que você está com essa cara?
—Professor, você tem que ir para o hospital, não para a academia.
—Para o hospital? Eu estou tão mal assim?
—Sim. Sua expressão é como se tivesse um prego enfiado no peito.
—…
—De verdade. Mesmo estando no hospital, você precisa se examinar. Estou falando muito sério.
Dohan inclinou a cabeça diante das palavras de Kim Hee-jae e então simplesmente coçou a cabeça. Hee-jae estava apenas preocupado com ele e, embora na verdade Dohan não tivesse a menor ideia do que estava sentindo ou o motivo pelo qual estava sentindo, era verdade que ele se sentia como se tivesse uma faca ou um prego bem enfiado no peito.
Mas lembrando que Hee-jae havia dito para ir ao hospital, Dohan sentiu como se tivesse encontrado uma solução mágica para seus problemas. Porque em primeiro lugar, nunca, realmente NUNCA havia experimentado essas emoções confusas antes e certamente precisava de algum tipo de orientação. Ele simplesmente estava lá, abaixando a cabeça diante de cada movimento de Hyewon, constantemente tendo delírios loucos por conta própria, e tendo um monte de outros pensamentos confusos que simplesmente o deixavam sem ar.
—Obrigado, Hee-jae. Acho que você está certo. Preciso ir a um especialista.
—Sério?
—Sim.
Ele sentiu como se de repente houvesse uma saída fracamente iluminada depois de tanto tempo na escuridão.
E justo antes de terminar seu turno, Dohan, com as mãos nos bolsos de seu uniforme de sala de cirurgia, caminhou por um tempo pelo corredor do centro cirúrgico antes de se aventurar um pouco mais para encontrar Hyewon. Não estava lá para tentar conversar com ele sobre o que estava acontecendo ultimamente, era apenas que… Ele pensou que precisava ver o rosto do homem por um momento para confirmar se sua condição física realmente se tornava anormal quando estava perto dele.
No entanto, assim que virou a esquina para tentar vê-lo à distância, e entrou no corredor que levava à sala de cirurgia, Dohan via Hyewon deitado. O homem estava esparramado no banco no final do corredor, olhando em sua direção Dohan viu uma aparência tão cansada quanto a que certamente se abatia sobre ele. Dohan havia pensado por um momento que se eles se encontrassem cara a cara, ele ficaria tão chateado quanto da última vez em que viu ele sorrir, então deliberadamente tentou se afastar e fazer com que seus horários de descanso não coincidissem. Mas quando o viu desta vez, seu coração ficou tão leve quanto um esporo de dente-de-leão no ar. Como se a presença do homem o fizesse flutuar.
Dohan lutou para esconder sua expressão trêmula e se aproximou de Hyewon enquanto notava como ele parecia quase derreter no banco. Observando fixamente, como se analisando o que ele fazia e o que não fazia perto do homem, descobriu também que sua maneira de andar havia começado a parecer tão errática como se fosse um brinquedo sem muita bateria ou um cachorrinho com grandes sapatos nos pés. Dohan achou que estava agindo de forma tão ridícula com o homem que até teve que fazer uma pausa para respirar e se acalmar antes que acabasse fugindo para o outro lado. Ele se aproximou, encostou as costas no encosto do banco e tentou suavizar ao máximo a expressão facial, então virou a cabeça:
—Como você está?
Mas quando Dohan se sentou ao lado dele, Hyewon moveu tão rapidamente a cabeça em sua direção que uma das lâmpadas do teto bateu diretamente em seus olhos. Era assim que os pacientes se sentiam quando estavam deitados na mesa da sala de cirurgia? Além do brilho em sua cara, estava tão nervoso de estar ao lado dele depois de semanas sem vê-lo que até parecia um homem prestes a passar por uma cirurgia importante.
Então, no momento em que a luz passou pelos olhos dele, lágrimas escorreram por seu rosto até parecer que ele estava chorando. Ele havia passado dias sem dormir e nem mesmo teve tempo de se sentir cansado ou de tirar um momento para si. E agora era como se tudo isso tivesse desabado sobre ele de uma vez até destroçá-lo completamente. Hyewon fechou lentamente os olhos e inclinou o corpo na direção de Dohan, por causa disso ele até começou a se sentir tonto. A cabeça do homem, pendurada no pescoço, tocou o ombro de Dohan e então cada uma de suas articulações pareceu repousar completamente sobre ele, como se lhe pedisse um momento para se recuperar da mudança de luzes.
Dohan ficou em choque.
Seu coração começou a bater como se estivesse louco e ele pensou que era apenas uma questão de tempo antes de parar, ele precisar reanimação cardiorrespiratória e ser levado para a sala de emergência para tratamento. Felizmente, se ele tivesse um ataque cardíaco no hospital, as chances de sobrevivência aumentariam drasticamente. Ainda mais porque Robodoc estava ao seu lado e porque havia um monte de enfermeiras que realmente fariam o que fosse preciso para não deixá-lo morrer.
Ele respirou. Tentou contar até dez.
Um.
Dois.
Três.
Quatro.
CINCO.
SEIS.
SETE.
OITO.
NOVE!
Socorro! Meu coração está quase saindo pela garganta!
Socorro!!
Talvez isso fosse uma doença cardíaca, mas de qualquer forma não parecia normal que fosse desencadeada por Hyewon.
—Oi…
Quando Dohan de repente acariciou a bochecha de Hyewon com o dorso dos dedos, Hyewon suspirou e acomodou a cabeça um pouco melhor, mostrando como tinha os olhos bem fechados. E no momento em que a luz atingiu seu rosto em cheio, sua impressão cansada e sensível começou a ficar mais evidente em todas as direções.
—Você está bem?
Hyewon não disse nada, apenas manteve a cabeça apoiada no ombro de Dohan. Seus ombros estavam encostados, a mão de Dohan acariciava seu rosto e seu peito se movia levemente a cada respiração. E naquele momento, cada segundo e cada minuto começou a parecer completamente dedicado aos dois. Então Hyewon sorriu.
—Oi…
—… Você está bem?
—Sim.
—Está com sono?
—Sim.
—Sério?
Como Hyewon continuava dando a mesma resposta às suas perguntas, Dohan virou um pouco a cabeça e olhou atentamente para Hyewon. Ainda com a testa do homem apoiada em seu ombro, ele pode ver que seus longos cílios estavam batendo nas lentes dos óculos, que a ponta de seu nariz estava vermelha e que seu peito continuava subindo e descendo alternadamente. Então ele sentiu que seu coração estava chegando a um ponto crítico e que o calor de seus corpos juntos era muito similar ao do verão que se aproximava rapidamente na Coreia.
—Estou cansado… Eu só… Preciso ficar com você.
Um sorriso involuntário apareceu de repente nos lábios de Dohan, que ainda estava observando o belo rosto de uma maneira, talvez, um pouco obsessiva. A verdade era que assim que ele olhou para aqueles lábios, a centímetros dos seus e um pouco entreabertos, uma sede louca e um impulso de se aproximar dele surgiram, fazendo com que se sentisse sufocado. Eles já estavam juntos, se acariciando e se tocando, então era como se o instinto tomasse conta de seu corpo novamente. Dohan conhecia a textura de seus lábios e o quão quente era aquela língua quando entrava em sua boca. E ele a amava. Ele precisava dela novamente como precisava respirar.
Dohan lambeu os lábios e agarrou o queixo dele.
—… Deus.
Mas ao perceber o que estava prestes a fazer, o rosto de Dohan ficou vermelho como uma maçã e ele se levantou da cadeira com um único movimento rápido. E Hyewon, que tinha a cabeça apoiada em seu ombro, quase caiu para frente de cara quando Dohan saiu. Ele não conseguia controlar suas próprias emoções e pensamentos e, embora inicialmente estivesse preocupado, logo estava tão excitado que sua mente ficou infinitamente confusa e seu corpo em um estado em que parecia impossível parar de tremer. Era como se a puberdade, aquele período de turbulência e fúria, tivesse retornado apenas para fazê-lo passar vergonha. Ele se sentia como se estivesse mergulhando os pés em uma banheira de água quente e logo numa bacia de água fria, trocando-as frequentemente.
Dohan riu, dizendo que era estúpido, mas Hye-won, que não entendeu o que aconteceu, apenas olhou para ele sem dizer uma palavra.
—Eu só… Eu…
Dohan virou a cabeça novamente e saiu do corredor quase correndo. Hyewon gritou o nome de Dohan várias vezes para que ele voltasse, mas ele não olhou para trás nem uma vez até chegar ao final do corredor.
Hyewon olhou para o lugar onde ele tinha desaparecido, mas antes mesmo de pensar nisso, o lembrete de que ele precisava começar sua ronda na sala de cirurgia soou em seu bolso fazendo “bip, bip, bip, bip”. E por outro lado, Dohan correu e correu até chegar à entrada do hospital. Claro, não foi o Hospital Universitário Deokwon, mas o lugar onde lhe diagnosticaram com um vínculo imaginário com seu melhor amigo.
Enquanto esperava sua vez na salinha, Dohan pensou em Hyewon e no que havia acontecido antes de escapar e, após esperar por quase uma hora, finalmente entrou na sala de tratamento e agarrou a cabeça.
—Eu preciso de ajuda. Eu não aguento mais. Já chega! Há mais sintomas.
—Quais?
—Minhas emoções sobem e descem dezenas de vezes por dia. É como se eu estivesse alternando entre paranóia, alegria e depressão. Eu… Geralmente fico com raiva como um louco, depois melhoro e depois começa de novo…
—O que mais?
—Estou muito estressado. Me preocupo com muitas coisas ao mesmo tempo. Meu trabalho e minha vida pessoal estão difíceis, mesmo assim eu presto atenção em cada movimento daquela outra pessoa como se não soubesse o que mais fazer.
Sua habitual aparência confiante e brincalhona desapareceu, e só restou um homem, sentado em uma cadeira na sala de tratamento, mostrando o quão terrivelmente confuso ele estava agora. Ele até parecia ansioso.
—Tenho pensado nele o dia todo e é difícil para mim me concentrar em qualquer outra coisa. Nem mesmo estou conseguindo fazer o meu trabalho direito.
—Não são esses sentimentos geralmente representativos de encontrar seu destinado?
Dohan olhou para o médico com uma expressão insatisfeita em seu rosto. Então, depois de piscar os olhos por um momento, olhou para o chão, não para o homem, e continuou.
—Estou com medo. Não importa o que seja, estou realmente com medo. É muito intenso. É demais para mim, então não consigo nem…… Eu não consigo ficar excitado se ele não estiver comigo. Você entende o quão longe isso foi?
—Senhor Dohan, isso é apenas…
—Não! Só… Por favor, por favor, me dê um remédio para me acalmar. Apenas me ajude com alguma coisa antes que eu deixe de ser eu mesmo! Não consigo lidar mais com isso. Eu realmente não consigo. Talvez o vínculo seja bom para outros Alfas, mas não é bom para mim. Eu não sirvo para ter um destinado!
E depois de uma longa consulta, o médico prescreveu um antidepressivo para ele, mesmo sabendo que ele não pretendia tomá-lo. Era apenas… uma consulta para tentar desabafar sua frustração com alguém, então o médico não disse nada muito perigoso ou algo que desse a ideia de que queria detê-lo.
Sentindo-se repentinamente patético e idiota como nunca antes, Dohan afundou em um banco vazio do parque que ficava em frente ao hospital e se lamentou até que duas mulheres passaram bem atrás dele, perto o suficiente para ouvi-las dizer:
—Aquele não é o Dohan?
Então ele olhou para trás ao som de suas palavras, mas as donas da voz já tinham ido embora.
Dohan balançou a cabeça enquanto olhava para a receita do tratamento para a ansiedade. Ele nunca pensou que chegaria o dia em que teria que pedir um medicamento como este na vida e definitivamente nunca pensou que chegaria a um momento em que se sentiria tão descontrolado por algo tão comum como o amor. Ele amassou o papel, colocou no bolso e pensou que só precisava de um tempo. Apenas um tempo para pensar decentemente sobre o que precisava fazer.
O turno já estava quase terminando.
°
°
Continua…